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Falemos algo com referência a eles, nossos irmãos.

Até hoje, ninguém sabe com segurança quantos vieram.

Humboldt, estudando a localização das raças na América, admite que, em princípios do século passado, constituíam, na população do Brasil, a parcela de quase dois milhões. 

Eram arrancadas ao lar como se furtam pássaros ao viveiro. 

Seduzidos e caçados sem compaixão, reconheciam-se, em breve, desiludidos ou puxados a ferro.

Dos porões de navios, chamados tumbeiros, em cujo bojo sofriam a tristeza e a solidão, a peste e a morte, eram trazidos à praça pública e vendidos em leilão à maneira de porcos.

Separados uns dos outros, traídos e seviciados, viam-se espalhados, aqui e ali, como burros de carga.

No entanto, formavam o sustentáculo do engenho e do cafezal, do moinho e da mineração, da cidade e do campo.

Nenhuma edificação do monumento brasíleo foi começada sem eles, mas por salário, ao martírio silencioso em que se sacrificavam, obtinham somente a senzala e o pelourinho, o flagelo e a humilhação, a algema e o chicote.

Muitas vezes, foram considerados em nível inferior ao dos animais.

Plantavam, criavam e construíam como autênticos desbravadores do deserto verde, contudo, não recolhiam dos senhores que os exploravam senão a escura retribuição do suor e das lágrimas.

Por mais de trezentos anos, na condição de cativos, cruzaram o litoral e a montanha, chorando e servindo...

Incorporaram-se, desse modo, ao tronco genealógico da família brasileira.

Arrebatados ao berço em que se desenvolviam, permaneceram agora, como é natural, jungidos à terra diferente em que se fizeram credores da evolução e do progresso.

Entretanto, a redentora lei de 13 de maio de 1888, que lhes devolveu a liberdade, não lhes atingiu de todo a vida espiritual, porque ainda hoje, abertas as portas do intercâmbio entre os dois mundos, ei-los de novo, atraídos e engodados nas múltiplas linhas do fenômeno psíquico, para continuarem na posição de elemento servil.

Abusa-se-lhes da ingenuidade, pede-se-lhes o concurso na magia deprimente, zurze-se-lhes o coração com exigências desprezíveis e suga-se-lhes o seio...

Espíritas do Brasil, pregoeiros da renovadora, quando em contacto com os desencarnados, que ainda se ligam ao mundo africano, por força de estágio evolutivo, olvidai a paixão escravagista, deles aprendendo a abnegação e a humildade e ajudando-os, em troca, a subir para mais altas formas de educação.

Manter o cativeiro do corpo ou da alma é falta grave, pela qual responderemos, um dia, nos tribunais celestes.

Lembremo-nos de que os escravos de ontem são igualmente nossos irmãos, e aos irmãos não se estende a canga opressiva e perturbadora, mas sim a fonte do amor e a bênção da luz.


Por: José Inácio Silveira da Mota, Do livro: Vozes do Grande Além, Médium: Francisco Cândido Xavier. Nota: Na fase terminal de nossas tarefas, na noite de 18 de agosto de 1955, o canal mediúnico foi mobilizado pelo espírito José Inácio Silveira da Mota, que foi senador do Segundo Império e valoroso abolicionista do cativeiro no Brasil. Honrando o nosso grupo com a sua presença, Silveira da Mota comenta, com brilho, a situação de muitos dos antigos escravos, em nossa Pátria, ainda hoje aprisionados pelas exigências dos irmãos encarnados, que lhes exploram a abnegação e o carinho.


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