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Meu caro Dirceu:

Escrevo-lhe esta carta para dizer que não morri. Jamais supus me fosse possível endereçar notícias a você, depois de afastar-me do corpo terrestre. Algumas vezes, vira o enterro de crianças e pessoas grandes, da janela grande de nosso quarto, quando observávamos, em silêncio, o carro triste, enfeitado de flora, conduzindo alguém que nunca voltava...

Recorda-se da morte de Osório, o nosso colega do grupo escolar? Nunca me esqueci do quadro enternecedor. Dona Margarida, a mãezinha em lágrimas, conduziu-nos a vê-lo. Osório, brincalhão e bondoso, estava mudo e gelado. Parecia dormir, imóvel sob um montão de rosas e saudades.

Quando ouvi dizer que ele jamais voltaria, meu coração bateu forte e empalideci.

Nosso velho Tomás, o porteiro da escola que assistia à cena, percebeu o que se passava e afastou-me depressa.

Nesse dia, não comi e passei a noite assustado. Atormentei o papai com toda a espécie de perguntas sobre a morte e arrepiava-me todo, recebendo-lhe as respostas. Por fim, ele reconheceu a minha inquietação e aconselhou-me a evitar o assunto.

Muito tempo passou, mas a experiência ficou guardada no meu coração.

Foi por isso, talvez, que fiquei, durante o período de minha enfermidade, impaciente e aflito.

E, para falar francamente a você, tive medo, muito medo, ao perceber que tudo ia acabar-se, pois sempre ouviria dizer que a morte do corpo é o fim de todas as coisas.

Agora, porém, posso afirmar que isso não é verdade.

Lembra-se do último dia que passei em casa?

Mamãe chorava tanto!...

Papai, muito sério, ia de um lado para outro, na sala contígua ao nosso quarto.

O Doutor Martinho, nosso bom amigo, segurava-me as mãos, e você, Dirceu, sentado na poltrona de vovó, olhava-me ansioso e entristecido.

Quis falar, mas não pude. Estava cansado sem saber o motivo. Faltava-me o ar, como se eu fosse um peixe fora dágua. Esforçava-me para dizer alguma coisa, pelo menos para tranqüilizar a mamãe; entretanto, havia um peso enorme, oprimindo-me a garganta e a boca.

Foi então que parei meu olhar em seus olhos e chorei muito, com receio de ficar mudo e gelado como o Osório, e partir para nunca mais regressar.

Não consegui mover os lábios, mas, em pensamento, rezei as orações que mamãe me ensinara. Lembrei-me de Deus e esperei o sono com indizível angústia...

Queria dormir, dormir muito, no entanto, era tão grande o meu temor de dormir sem acordar, que, se eu pudesse, teria gritado intensamente, com toda a força de meus pulmões, pedindo ao Doutor Martinho que não me deixasse morrer.


Por: Neio Lúcio, Do livro: Mensagens do Pequeno Morto. Médium: Francisco Cândido Xavier


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