Maria Boneca

(Versos dedicados à dama feudal que abraçamos por devotada amiga, há três séculos, e que hoje expia, na via pública, sob a alcunha de Maria Boneca, o delito de haver exterminado o filho jovem que lhe estorvava a existência de irresponsabilidade e prazer.)


Reencontrei-te, por fim, esmolando na rua.
Nada recorda em ti a dama do castelo.
Lembro-me!... Dás à fossa o filho louro e belo,
Esqueces, gozas, ris... E a festa continua...

Depois, a morte vem... A memória recua...
Escutas em ti mesma o trágico libelo,
Choras, nasces de novo e trazes por flagelo
A sede de ser mãe que a demência acentua!...

Como dói ver-te agora os tristes olhos baços!
Guardas, louca de amor, um boneco nos braços,
Em torno, há quem te apupe a trilha merencória...

Mas bendize, senhora, a lei piedosa e austera,
Alguém vela por ti: o filho que te espera
E há-de levar-te aos Céus em cânticos de glória!...


Epiphanio Leite