Outra Opinião

- Tenho meu coração agoniado e defendê-lo-ei até o fim. Estive com o gerente e conversamos sobre o assunto. Nosso caro Roque não agiu com premeditação. Não se pode afirmar que é realmente furto. O homem está obsidiado, mas infelizmente o Banco não sabe disso.

Era Raimundo Cecílio, o contador de grande organização bancária, advogando a causa de um colega que fugira pela manhã, carregando consigo nada menos que oitocentos mil cruzeiros.
O pequeno círculo de amigos, a princípio severo, como que se adoçava. A opinião de Raimundo era água fria na fervura.

E continuava:

- Quem de nós está livre? Amanhã, o assédio das entidades perturbadas e infelizes pode voltar-se contra nós. É preciso compreender. Roque está doente. Doente da alma.
- Entretanto – opinou um companheiro -, é esquisito! Olhe bem que ele soube empalmar com absoluta mestria oitocentos contos de uma só vez.
- Como poderia ser até mais – atalhou Cecílio, conciliador -; lembre-se que ele tem os sentidos obliterados.
E enquanto o grupo chegava ao serviço, outro amigo acentuou:

- Raimundo, graças a Deus temos em você um companheiro espírita compreensivo e cristão.
Um apoio fraterno, solucionando-nos as dificuldades morais.
- Ora, ora! Isso é dever de nós todos – respondia Cecílio, convicto.
No saguão, porém, um contínuo aproximou-se e notificou:
- Sr. Raimundo, o senhor já soube?
- Soube o que?
- O Roque, ao fugir hoje, pela manhã, carregou a capa que o senhor deixou aqui ontem?
E Cecílio, que se arvorara em defensor do colega, gritou, completamente transtornado:
- Gatuno! Cão vil! Pagará caro!Ele há de ver!


Hilário Silva